História

Pedaços da história

Álvaro Holden Roberto e a criação de uma ampla frente de luta contra o colonialismo português.

Álvaro Holden Roberto, após o desencadeamento da luta de libertação nacional em 15 de Março de 1961, e mesmo antes, sempre se preocupou com a criação de uma ampla frente política e militar contra o regime opressor e esclavagista português. Nesses seus esforços, Álvaro Holden Roberto, solicitou os bons ofícios de eminentes estadistas africanos da época, tais como Ahmed Sekou Touré, seu amigo pessoal, Osagyefo Kwame Nkrumah, um dos seus mentores políticos, Cyrille Adoula, (seu amigo pessoal), Mwalimu Julius Nyerere, Leopold Sédar Senghor, David Kenneth Kaunda (KK), Alphonse Massamba-Débat, Gamal Abdel Nasser (Bem Bela), e muitos outros. Houve vários encontros oficiosos e públicos com o MPLA, já liderado pelo saudoso António Agostinho Neto e com o Partido Democrático Angolano PDA, liderado por Emanuel Kunzika. Durante esses encontros, surgiram falsas diferenças ideológicas, sobretudo no que respeita ao MPLA, que dizia ser um partido de tendência Marxista-Leninista… Que tamanha falsidade! Na realidade, o MPLA era um partido que tinha no seu topo, mais concretamente na sua direção, admiravelmente para a época, elementos pequeno-burgueses. Com o Partido Democrático Angolano, PDA, as conversações foram mais céleres. Assim, com base numa convenção cuidadosamente redigida, foi constituída em 27 de Março de 1962, em Kinshasa, capital da República Democrática do Congo, a histórica e imortal Frente Nacional de Libertação de Angola, FNLA, resultado da fusão entre a histórica e gloriosa UPA e o PDA. A FNLA, ora criada, não era uma mera “obra” que só ficou estampada no papel, era uma frente devidamente estruturada e organizada da seguinte maneira: 1- Conselho Nacional (que tinha competências equivalentes as de um Comitê Central). 2- Comissão Executiva (que era encabeçada por um presidente assistido de um vice-presidente). Estas funções eram respetivamente exercidas pelos nacionalistas Álvaro Holden Roberto – presidente e Emanuel Kunzika – vice-presidente (já falecidos). A presidência da Comissão Nacional foi atribuída ao brilhante e saudoso David Livramento, falecido durante uma reunião maratónica do conselho nacional, que tinha como agenda a criação do histórico e destemido Exército de Libertação Nacional de Angola “ELNA”. Nessa reunião o PDA curiosamente, continuou a defender as suas teses de Partido não violento, o que significava dizer que eles preferiam a via politica, apostando em negociações com a potência colonial portuguesa. Houve, portanto, um verdadeiro braço de ferro entre a UPA, que insistia na continuação e intensificação da luta armada e o PDA que preferia a via pacifica. Após longas e árduas discussões, a tese da UPA, acabou por vingar, abrindo assim o caminho para o funcionamento da Frente

Nacional de Libertação de Angola. Não foi nada fácil, diga-se em abono da verdade. Após a morte de David Livramento, a presidência do Conselho Nacional foi atribuída ao Reverendo Dom Nicolai André Massaqui. A FNLA recebeu pois, o facho da luta armada de libertação nacional, contra o retrogrado colonialismo português e conduziu-a vitoriosamente até a assinatura do acordo de tréguas com o governo português da época, em 14 de Outubro de 1974, a bordo do iate do malogrado Marechal Mobutu Ses Seko Kuku Gbendo Wa Zabanga, ancorado no seu porto no o rio Zaire, em Leopoldville. A delegação da FNLA, era conduzida por Álvaro Holden Roberto e integrada por Johnny Pinnok Eduardo, Ngola Kabangu, Hendrik Val Neto e Sebastião Lubaki Ntemo, a delegação portuguesa era chefiada pelo destemido General Fontes Pereira de Melo e faziam parte dela o Comodoro Leonel Cardoso, os Coronéis Cabarrão e Gonçalves Ribeiro. Permitam-me aqui fazer uma revelação histórica. Durante uma pausa, observada para um brinde com Maluvo (vinho de palma), oferecido pelo carismático Marechal Mobutu, o General Fontes Pereira de Melo chamou à parte Álvaro Holden Roberto, e segredou-lhe o seguinte: Eu sou seu parente, a minha mãe era cabrita, filha de uma mestiça originária de M’Banza Congo. Álvaro Holden Roberto ficou estupefacto, mas disse logo a seguir: São coisas do secular colonialismo português! Assim a FNLA é um partido político que não parou na história. Apesar das ondas antagônicas que visavam a sua destruição (tarefa levada a cabo pela sinistra PIDE e pelo seu adversário MPLA). A FNLA transformou-se num grande projeto político nacional. A sua trajetória até aos dias de hoje, foi marcada igualmente por desentendimentos, ver mesmo dissidências internas. Este capítulo será sem tabu, ampla e profundamente abordado pelo autor num dos seus próximos textos em Pedaços de história. Para consolidação e extensão da sua organização tanto no plano nacional (zonas libertadas) como internacional, angariamento de apoios diplomáticos e financeiros, a direção da FNLA criou dois importantes órgãos a saber: O Governo Revolucionário de Angola no Exílio GRAE em 5 de Maio de 1962, o Exército de Libertação Nacional de Angola ELNA, em 16 de Agosto de 1962. Para assegurar a defesa dos direitos dos trabalhadores numa Angola independente, a FNLA impulsionou a criação da Liga Geral dos trabalhadores de Angola LGTA. Esta última durante muitos anos, fez a sua aprendizagem junto de organizações sindicais que funcionavam nos países que asseguravam o apoio diplomático à FNLA, com destaque para a República Democrática do Congo, Tunísia, Israel e outros. A LGTA foi inicialmente liderada por André Cassinda (num dos próximos textos de Pedaços de história falarei longamente, sobre a dissidência desse compatriota já falecido). Mais tarde essa dinâmica central sindical, entende-se a LGTA foi conduzida pelo intrépido Barreiro Lulendo, irmão do lendário Francisco Borralho

Lolendo, um dos fundadores da histórica e gloriosa União das Populações de Angola UPA.

Preocupada com a dispersão (correntes políticas) dos estudantes Angolanos sediados em vários países da Europa, Ásia, África e Estados Unidos da América, a FNLA através do seu braço juvenil a JFNLA, impulsionou a criação da União dos Estudantes de Angola UNEA. Este assunto, sobretudo o papel desempenhado pelo nacionalista Jorge Alicerces Valentim, será tratado pelo autor num dos próximos capítulos de Pedaços de história. Como não se pode nem se deve manchar uma grandiosa data, 27 de Março de 2022, que marca o sexagésimo aniversário da fundação da FNLA. Prometo tratar igualmente com rigor moral e intelectual as “turbulências” ocorridas no interior da FNLA de 1997 até a realização do já histórico congresso de reconciliação, do qual saiu uma jovem, dinâmica e promissora direção. Concluindo este texto, quero homenagear respeitosa, sentida e de maneira póstuma os pais fundadores da Frente Nacional de Libertação de Angola FNLA, que foram os seguintes: Álvaro Holden Roberto, Emanuel Kunzika, Dom Nicolai André Massaki, David Livramento, Jonas Malheiro Savimbi (Cyaya), José João Lyaúka, Ferdinand Dombele, Sebastião Lubaki Ntemo, Francisco Paka Nenganga, Fernando Pio do Amaral Gourgel, John Eduardo Pinnock, André Rosário Neto, Johny Pinnok Eduardo, António Matumona, Domingos Vetokele, Nsanda Martin. Estes foram os pais fundadores que já passaram para a eternidade, e merecem todo o nosso respeito, por terem dado toda a sua juventude, disponibilidade e dedicação para a criação de um dos maiores partidos políticos ao Sul do Saara. Terminando, quero saudar efusivamente e desejar a todos os valorosos e destemidos militantes da FNLA, incluindo os numerosos simpatizantes e amigos em toda a extensão do território nacional, assim como a todos aqueles que por razões diversas fazem parte da diáspora, um FELIZ ANIVERSÁRIO. FNLA OYÉ. ÁLVARO HOLDEN ROBERTO (KULUBIMBI) OYÉ, ANGOLA OYÉ.

Ngola Kabangu, aliás Yala Nku, militante histórico da FNLA e Antigo Combatente do 1º. Grau.